Sou requisitada a dizer para as pessoas o que elas devem
fazer quando as crianças se beijam na boca.
“O que fazer quando uma menina beija outra menina?” – eu ocupo
posição privilegiada para responder isso.
Eu, justo eu!
Por que essa tarefa injusta, que me faz engolir um sapo
atrás do outro, quando tenho que ser simpática e cuidadosa para dizer o óbvio?
É um esforço fenomenal não poder gritar aos quatro cantos o
quanto o mundo é preconceituoso e careta e hipócrita e limitado e ignorante e
não sabe o que é bom.
O que é bom é poder aceitar os convites que te parecem interessantes,
é poder experimentar o que se deseja, é poder escolher viver plenamente o curso
da própria vida sem se preocupar em ter que explicar o que você é o tempo todo.
O bom é poder estar, sem se prender nas exigências do é. O
que você é? O que isso significa?
Significa que estou feliz. Ponto.
“E a menina que beijou a outra na escola? Já expliquei que
meninas beijam rapazes... e o que mais devo fazer?”
E se simplesmente disséssemos para ela que a organização da
escola, no momento, não tolera beijos na boca e que podemos combinar de que não
nos beijaremos na escola? E se a gente pensar que ela pode estar apenas
explorando a sua sexualidade sem muito planejamento, apenas interagindo com a
pessoa mais próxima e confiável, que no momento era a melhor amiga? E se, de
fato, considerarmos que esta criança está começando a exercer sua
preferência/condição em termos de sexualidade e está mesmo beijando a colega
que ela está afim, o quê qualquer intervenção/preocupação heteronormativa de
nossa parte fará de bom a essa criança, se não contribuir para que ela se sinta
inadequada?
E tudo isso eu precisei dizer, com calma e tranquilidade.
Tinha que ser eu.